terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES... Em Tempos de Tragédia!


Talvez o grande público nunca tenha ouvido falar de Geraldo Vandré. Até porque a grande maioria hoje não lê.  A “cultura musical” de massa destes tempos não é arte. Não há letra... apenas um amontoado de besteirol apelativo com clichês sexuais. Ainda existem exceções honrosas. O título acima é o mesmo da música mais difundida de Vandré, apresentada ao público no III Festival da Canção em 1968 (faz tempo...), em plena ditadura militar. Vandré foi advogado, culto e sua música tornou-se símbolo da resistência da ditadura militar no Brasil, embora ele a tenha composto sem essa finalidade.

Num dos versos Geraldo Vandré dizia: Os amores na mente/As flores no chão/A certeza na frente/A história na mão/Caminhando e cantando/E seguindo a canção/Aprendendo e ensinando/Uma nova lição.  O refrão dizia: Vem, vamos embora/Que esperar não é saber/Quem sabe faz a hora/Não espera acontecer.

Por que meti Geraldo Vandré nesta história de tragédias? Você vai entender. Escrevi três artigos neste blog sobre a “tragédia de Santa Maria e o amor de Deus”. Mas, neste, não quero escrever da de Santa Maria. Quero escrever sobre as tragédias! E foram tantas. A última grande foi a de Santa Maria.

Se as informações estão corretas a de Santa Maria/RS foi a segunda maior do mundo em ambiente fechado. Até ontem foram 237 mortos. Quase todos jovens estudantes entre 16 e 24 anos que foram se divertir na boate Kiss (que em português seria Beijo). Ouvi as autoridades dizerem que a Boate não deveria estar funcionando. Engraçado que, após a tragédia, dezenas de boates Brasil afora foram lacradas e, pasmem, quase todas elas estavam com alvarás aprovados. Segundo consta a Kiss estava sem alvará desde agosto do ano passado.  E antes disso? Desde quando ela funcionava? Quem o culpado, e ou, culpados? Os seguranças completamente despreparados para emergências? Os donos da boate que só queriam saber de faturar? O “corpo de bombeiros” que emitiu os alvarás anteriores? Os bombeiros que tinham uma empresa e executaram serviços “técnicos” na boate e, talvez por isso não precisasse de alvará? A prefeitura que tem o dever de fiscalizar todas as obras, construções e casa de espetáculos e não o fez? O governo do Estado que não obrigou a prefeitura a adequar seu código municipal ao Estadual? A banda que não tem a mínima sensatez de saber que não se deve soltar fogos em ambiente fechado?  As mesmas perguntas cabem a todas outras tragédias ocorridas neste país.

Mas, não posso deixar de pensar e perguntar: Onde estava o esquema de segurança? Ele existia? Foi negligenciado ou não existia? O que é um “esquema de segurança”? Todo esquema de segurança precisa ter regras claras, claramente transmitidas e obrigatoriamente respeitadas. Regras que os donos da boate teriam que saber; que os seguranças teriam que dominar; que a banda teria que se sujeitar; que os jovens que pagaram o ingresso teriam que receber, assimilar e obedecer. Todos teriam que saber claramente as regras, as saídas de emergência, o que poderia e que não poderia ser feito.

Pelo que li e vi pela televisão, aquela boate nunca teve esquema de segurança e, das vezes que estava com alvará, o problema era o mesmo. Ou seja, as mortes aconteceriam com ou sem alvará. Simplesmente porque não existia um “esquema de segurança”.

Qual a dedução lógica? Estão querendo culpar alguém. Então que se comece de cima pra baixo. O governador é culpado, o prefeito também, os vereadores idem, os fiscais da prefeitura igualmente, os bombeiros sem dúvida, os donos da boate de igual forma, a banda com seus músicos não podem ser eximidos, os seguranças destreinados também... ufa, é bom parar por aqui porque, com certeza, vou descobrir que a presidente Dilma também é culpada. Afinal, a política brasileira é uma brincadeira só. Depois de tudo isso, ainda elegeram um “senhor honesto e ético” como presidente do senado brasileiro; um tal de Renan, que precisou renunciar para não ser cassado.

Isso significa que a vida, neste país, não tem valor algum. O que importa é o vil metal, o lucro. Quer seja financeiro ou político. Há uma lei caduca de 1940 que diz que desacatar funcionário público dá cadeia ou multa. Mas inexiste uma lei que diz que dá cadeia ou multa quando o político ou funcionário público desacata o público. Ora, o político, obrigatoriamente, é funcionário público, ou seja, recebe do patrão público que o elege e paga impostos que, dentre outras coisas, paga o salário do político e de todos os funcionários.  Alguma coisa está errada neste reino.

Do presidente da república ao vereador, todos recebem do suado dinheiro da população para garantir segurança, educação, moradia, alimentação e tudo mais, daquele que é o verdadeiro patrão: a população que paga impostos. Se tudo isso inexiste para a maioria da população, por uma questão de lógica, todos os governantes são os culpados por todas e quaisquer tragédias que aconteçam neste país.

Após cada tragédia buscam-se os culpados! O governador culpa o prefeito, que culpa os bombeiros, que culpam os empresários da boate, que culpam os seguranças, que culpam a banda e assim vai. Nunca há “homens e mulheres de verdade” que assumam sua parte na culpa existente. Sempre se pune de baixo para cima, quando o inverso seria o certo. Tenho dito que o Brasil sofre de indigestão de leis... para não serem cumpridas. Aliás, nos meandros da lei existem aberturas – de propósito – por onde se safam os verdadeiros culpados. Pena que eles não possam culpar os mortos.  Mas, ainda vão culpar os familiares que permitiram que seus filhos fossem se divertir. Ora bolas... onde estão aqueles que fazem as leis e não as fiscalizam?

Volto a perguntar: e onde está o “esquema de segurança”?  Se ele existisse de verdade, nada disso teria acontecido. Não adianta culpar a banda pelo show pirotécnico com um canhão de fogo que atingiu o teto. Se houvesse sistema de segurança o artefato lá não teria entrado. Os seguranças estariam preparados, as saídas de emergência estariam lá e prontas a serem acionadas, os bombeiros estariam preparados para tantas vítimas.  O fato é que os verdadeiros culpados por esta e todas as outras tragédias são “donos do poder”.

Meu leitor, procure saber o que aconteceu com as grandes tragédias em outros países um pouco mais sérios. Depois das tragédias foram tomadas medidas sérias em nível nacional visando evitar novas desgraças. Em 1942 em Boston (EUA), numa boate, morreram 492 pessoas. Na China, com a morte de 309 em um clube. Foram feitas leis que são fiscalizadas rigorosamente de cima para baixo, ou seja, o governo federal fez as leis e as fiscaliza de tal forma que governadores, prefeitos e vereadores são punidos se tais leis não forem cumpridas. Aqui impera a famosa “lei de Gerson”, onde alguém sempre leva vantagem. E esse alguém não é o povão que paga religiosamente seus impostos e é sempre desrespeitado.

A corrupção grassa solta neste país. Veja as chuvas no Rio, quando verbas são desviadas ano após ano. É tragédia anunciada e os donos do poder se locupletam, juntamente com os parceiros endinheirados, e ou, políticos “farinha do mesmo saco”. E os desabrigados continuam desabrigados, apesar de toda dinheirama derramada e repartida pela confraria.   E os incêndios continuam, os desabamentos de prédios também, as casas queimadas em favelas da mesma forma, os bueiros continuam explodindo... bem, a lista seria grande demais. Os que tem o dever de fiscalizar fazem “vista grossa”, pelo vil metal.

Por causa do futebol, o brasileiro é, quase sempre, antiargentino. Mas, veja um exemplo que vem de lá. Em 2004, numa discoteca em Buenos Aires, morreram 194 pessoas. Foram presos como culpados o funcionário público que assinou o alvará de funcionamento e mais três fiscais da prefeitura que “fiscalizaram” na base do “faz de conta” e, também, o proprietário da discoteca. Eles cumpriram suas penas de forma integral e serviram de exemplo. Não houve advogado, nem lei que desse jeito.  O que será que aconteceria em plagas brasileiras? Ora, o que sempre aconteceu e vai continuar acontecendo. Uma rápida prisão de alguns por poucos dias, chamada de “temporária”, depois a liberdade. O caso volta a ser julgado, talvez, uns 10 ou 15 anos depois.  Por que? Os verdadeiros culpados – os que fazem as leis e não as cumprem – sabem que é melhor não mexer nisso. Até que nova tragédia aconteça e o ciclo se repita. Eles sabem que a punição deve acontecer de cima para baixo; mas, como são relapsos, desonestos e corruptos – com honrosas exceções – jamais se autopunirão ou aprovarão leis nesse sentido.

Bem, você deve estar perguntando: e o que tem a música do Geraldo Vandré com isso? Nada e tudo. Nada, porque Vandré é de outro tempo. Tempo onde se tinha ideologia e por ela se lutava. Tempo em que havia muita música boa e com letras que diziam alguma coisa, ou muita coisa. Verdade que havia porcaria também; mas, não muito.  E tem tudo a ver. Veja o que ele disse: Vem, vamos embora/Que esperar não é saber/Quem sabe faz a hora/Não espera acontecer.  Não vou dissecar a poesia, nem fazer análise gramatical de qualquer tipo.  Essa música ficou mais conhecida como “caminhando”.  O povo saía à rua com essa música na mente, no coração e na boca exigindo mudanças no cenário político nacional. Foram anos de luta contra a impunidade, contra a ditadura militar. Não cabe neste cantinho, a mim, julgar o processo político existente. Por causa dessa letra Vandré foi expulso do país e exilado.

Afinal, a conclamação estava nas ruas: Vem, vamos embora, que esperar não é saber. Até quando o povo brasileiro vai esperar acontecer novas tragédias? Vem, vamos embora, unidos fazer alguma coisa contra esse Estado sádico e corrupto. Esperar não é saber. Por que? Quem sabe faz a hora e não espera acontecer novas tragédias. Vandré ainda diz na sua música que: “Somos todos iguais, braços dados ou não, nas escolas, nas ruas, campos, construções, caminhando e cantando e seguindo a mesma canção”. Ele também, como eu, não acreditava na luta pela força. Por isso, sua música ainda diz: “... Indecisos cordões, ainda fazem da flor seu mais forte refrão, e acreditam nas flores vencendo o canhão”.  E que tal isso: “... As flores no chão, a certeza na frente, a história na mão, caminhando e cantando e seguindo a canção, aprendendo e ensinando uma nova lição”.

“Aprendendo e ensinando uma nova lição”! O que é que a história nos tem ensinado sobre essas tragédias? Temos aprendido e ensinado essas novas lições? A pergunta é: o que EU tenho feito para que novas tragédias não aconteçam? Pra não dizer que não falei das flores... elas estão aí, sobre os caixões, túmulos e valas de todos os mortos de todas as tragédias. Santa Maria foi a mais recente! Quantas mais ainda virão?
Não tenho qualquer dúvida que quando Deus adentrar na mente, no coração, na vida prática e diária das pessoas, o mundo poderá ser diferente. Mas, para que isso aconteça EU tenho que fazer a minha parte e fazer bem feito. Pensar mais no próximo e menos em mim. Para a honra e glória de meu Senhor Jesus Cristo. Amém


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